sexta-feira, 18 de novembro de 2011

História - Poderes Especias - Por: Tuvia Bolton



Poderes Especias
Por: Tuvia Bolton



Era uma noite escura e gelada na Rússia, há cerca de duzentos e cinqüenta anos. O notável mestre chassídico Rabi Yehoshua Heshel de Apta estava sentado em sua sala estudando Torá quando ouviu uma batida na porta.

Eram três horas da manhã. O Rebe quase nunca 
dormia, mas era bastante incomum que alguém batesse a essa hora, a menos que fosse realmente uma emergência.



Um homem obviamente perturbado foi convidado a entrar. Suas roupas estavam em desarranjo como se ele não dormisse há dias, e parecia quase insano de tanta ansiedade.

“Rebe!” implorou ele, os olhos vermelhos de pranto e exaustão. “Minha esposa está em trabalho de parto há três dias, mas o bebê não nasce. Os médicos dizem que terão de operar, mas estão preocupados. Rebe, faça alguma coisa! Diga-me o que fazer!”

O Rebe pousou as mãos sobre a mesa e então abaixou a cabeça entre as mãos, como se estivesse em profunda contemplação ou prece.

Permaneceu assim durante alguns minutos, enquanto o pobre homem ali ficava, perplexo, sem saber o que fazer. Deveria ir embora? Deveria dizer alguma coisa?

O Rebe finalmente levantou a cabeça e disse solenemente: “Pode ir para casa. Você tem um novo filho. Sua mulher acaba de dar à luz a um menino. Mazal Tov!”

Ele não podia acreditar em seus ouvidos. Mas por que o Rebe estava tão sério? Agarrou a mão do Rebe entre as suas e disse: “Obrigado, Rebe, obrigado!” umas dez vezes sem parar, saiu da sala quase tropeçando nos próprios pés e correu para casa o mais depressa que pôde.

Assim que abriu a porta ouviu o choro do bebê, e ali estava sua esposa, exausta mas viva e até sorrindo fracamente. Ele irrompeu em lágrimas de júbilo e gratidão. Era um milagre!

No dia seguinte retornou ao Rebe para desculpar-se por invadir-lhe a casa na noite anterior e agradecer novamente. Porém os chassidim do Rebe o detiveram antes de entrar, e insistiram para que ele perguntasse ao Rebe o que acontecera – o que o Rebe tinha feito durante aqueles minutos em que estava numa espécie de transe, com a cabeça aninhada entre as mãos?

A princípio ele não queria participar daquilo. Mas finalmente concordou e quando estava a ponto de deixar a sala do Rebe pediu humildemente uma explicação para o milagroso nascimento de seu filho. O Rebe respondeu com a mais profunda seriedade:

“Seu filho tem uma alma muito elevada. Ela não queria deixar a pura verdade espiritual do céu para entrar neste mundo de falsidade e tribulações.

“Portanto, falei com a alma. Prometi que quando ela descesse ao mundo receberia poderes especiais que não estão disponíveis nem mesmo nos âmbitos espirituais mais elevados. E estes poderes especiais lhe permitirão servir a D’us acima de todas as limitações. Somente então a alma de seu filho concordou em vir a este mundo.”

Quando os chassidim ouviram o que o Rebe tinha dito, tomaram grande interesse pela criança: quem sabe que pessoa notável ele seria! Decidiram acompanhar seu desenvolvimento.

Um ano depois do nascimento, a mãe faleceu. Sete anos depois seu pai também partiu deste mundo, deixando o menino completamente órfão.

Ele foi enviado de um parente a outro e, embora os chassidim fizessem o possível para ajudar, naqueles dias terríveis de perseguição e pobreza sob o Czar Nicolau (de amaldiçoada memória), não havia muito que pudesse ser feito.

Quando o menino tinha apenas dez anos foi recrutado para o exército com outro menino. (Eram os dias dos temidos decretos “cantonistas” quando, por ordem do czar, os meninos judeus eram levados à força ao exército como um meio de forçar sua conversão ao Cristianismo.) A partir de então a única conexão que os chassidim tinham com ele era por correspondência. Escreviam uma vez por semana e o menino respondia sempre que possível. 

Suas raras cartas contavam como eles o estavam torturando e punindo por não comer porco e por tentar guardar o Shabat, mas que estava resolvido a nunca se separar do D’us de Israel.

Então as cartas cessaram.

Um ano e meio depois, eles receberam uma carta relatando que o menino tinha falecido, resultado de uma surra que recebera ao recusar-se a se converter.